O MUNDO ACORDOU PORQUÊ ?
Goma:pequena vila do noroeste do Zaire, junto ao lago Kivu. Uma das mais belas e luxuriantes zonas do país. 3000 habitantes em tempo de paz.
De um dia para o outro "batem-lhe à porta" mais de 1 milhão e duzentas mil pessoas.
Surgem os campos de refugiados como "cogumelos": Katale (250.000), Kibumba (350.000), Kanayacushinga (60.000), Munygyi (150.000), Goma (200.000), Keshero, Kituku, Mugunga (120.000).
Não há tendas, não há alimentos, não há água, o solo vulcânico não permite a perfuração de fossas sépticas, não se enterram os cadáveres que caem às centenas não, não, não... As condições ideais para a cólera que rapidamente se tranforma em epidemia, as disentrias, a meningite, etc.
Chegam a Goma no auge do problema: morrem em média 1.200 refugiados por dia, só na cidade. A situação está fora de controle.
A ajuda alimentar ainda não chegou. A água é insuficiente. A primeira impressão que sentem é de total impotência.
O esforço psicológico pessoal a fazer é colossal: Há que ver o problema caso a caso, doente a doente e evitar o global! É simples: só podem socorrer aqueles que conseguem chegar até ao posto. Os outros há que tentar não vê-los, até porque a maioria já se deitou definitivamente, esperando a morte.
Fernando Nobre, Chefe da equipa, é cirurgião geral. Fundador e Presidente da AMI,Maria Luísa Gonçalves, psiquiatra no Hospital Miguel Bombarda, José Diogo, Clínico Geral no Centro de Saúde das Caldas da Rainha, Irineu Lobo, Enfermeiro no Hospital Santa Maria, Hugo Medeiros, Enfermeiro, faz a sua estreia na AMI, José Luís Nobre, licenciado em Ciências Políticas.
Espera-os um cenário dantesco, indiscritivel.
Nem as imagens profusamente difundidas pelos canais da televisão os prepararam para a realidade: o cheiro a cadáver e fezes é nauseabundo!
A nossa equipa trabalha no campo de refugiados de Kibumba. Das 8h às 17h não param e em conjunto com uma equipa de mais de 6 elementos da Federação Internacional da Cruz Vermelha e uma equipa de enfermeiros ruandeses e zairenses vêem entre 5 a 7.000 doentes por dia. Alguns biscoitos constituem o almoço. E ali estão nove horas a fio, mergulhados no horros, a tentar salvar vidas.
Todos os cuidados são poucos: micróbios não faltam e as condições de higiene são quase nulas. Medem a gravidade da situação, todas as manhãs, a caminho do campo, contando os cadáveres enrolados em esteiras ao longo da estrada, à espera de serem recolhidos pelas equipas constituidas para o efeito:
Nos primeiros dias contam mais de 100 cadáveres em 5 Km. As estimativas sobre os mortos, deslocados, desaparecidos, etc. sucedem-se. Em fins de Agosto o balanço feito pelo vice coordenador do Gabinete de emergências das Nações Unidas para o Ruanda aponta para mais de um milhão de mortos.
Em fins de julho morriam nos campos à roda de Goma na ordem de 7.000 pessoas por dia.
Um mês depois, o número decresce para um total de 300 a 400, dos quais 100 em kibumba.
A ajuda humanitária foi eficaz ainda que tardia, e o papel das Organizações Não Governamentais revelou-se essencial. Sem elas 50 a 60% dos refugiados não teriam resistido.
Ao fim de um mês, é preciso ser-se frio, fazer um balanço, tomar decisões.
O pior já passou, a equipa está exausta e o custo da missão foi: 15.000 contos.
Há que fechar a missão. fica a satisfação de deixar Goma numa situação controlada, fora a tragédia com que a equipa se defrontou logo de ínicio.
OS campos estão organizados, já com alguns mercados autónomos com géneros. Sinais de esperança para um povo martirizado?
A resolução do problema passa agora pela vontade firma da Comunidade Internacional através das agências das Nações Unidas de criar condições para o regresso dos refugiados para o seu país de origem: O Ruanda.
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