sábado, 14 de fevereiro de 2009

Carta de Amor de FERNANDO PESSOA à sua namorada Ophélia (como se namorava em 1920!)


Meu Be«be»zinho lindo:
Não imaginas a graça que te achei hoje á janella da casa de tua irmã! Ainda bem que estavas alegre e que mostraste prazer em me ver (Alvaro de Campos).
Tenho estado muito triste, e além d'isso muito cansado - triste não só por te não poder ver, como tambem pelas complicações que outras pessoas teem interposto no nosso caminho. Chego a crer que a influência constante, insistente, habil d'essas pessoas; não ralhando contigo, não se oppondo de modo evidente, mas trabalhando lentamente sobre o teu espirito, venha a levar-te finalmente a não gostar de mim. Sinto-me já differente; já não és a mesma que eras no escriptorio. Não digo que tu propria tenhas dado por isso; mas dei eu, ou, pelo menos, julguei dar por isso. Oxalá me tenha enganado...
Olha, filhinha: não vejo nada claro no futuro. Quero dizer: não vejo o que vãe haver, ou o que vãe ser de nós, dado, de mais a mais, o teu feitio de cederes a todas as influencias de familia, e de em tudo seres de uma opinião contraria á minha. No escriptorio eras mais docil, mais meiga, mais amoravel.
Enfim...
Amanhã passo á mesma hora no Largo de Camões. Poderás tu apparecer á janella?
Sempre e muito teu
Fernando
27/4/1920

1 comentário:

Maria Monteiro disse...

Mas que ternura e, ao mesmo tempo sofrimento! Uma "delícia" ora doce, ora sofrida.
Afinal, "Cartas de amor, quem não as escreve?"
Obrigada Isabel!